A luz se foi no subúrbio.
a escuridão pintou as esquadrias
das casas de alvenaria de preto.
destemidos,
os gatos correram sobre os muros.
atônitas as famílias lamentaram
e perguntaram uns aos outros:
e agora, o que fazer?
Os televisores ridículos e murchos
se esconderam na escuridão da mobília,
as velas incendiaram suas telas
gigantes
e a luz amarela refletiu sua vergonha.
pequenos pés descalços e
despreocupados
logo se espalharam pelo asfalto,
os pneus nervosos estacionaram
vergonhosos da nudez dos pés infantis
um violão soou desajeitado e logo se
ajeitou.
um belo samba se fez ouvir.
açoitados pela brisa que além de
vento trazia musica
os postes de luz foram morrendo
as lampadas de mercúrio incandescentes
desencandesceram
os cabos elétricos sem eletricidade se
tornaram inúteis
e dentro das casas as camisas de força
se rasgaram.
todos correram para olhar o céu
a lua, até então tímida se abriu,
estava cheia de luz
e vestida de suaves nuvens de seda.
tantas e tantas estrelas foram nascendo
e enquanto nasciam
bordavam os sorrisos dente a dente.
a suave brisa trouxe até aqui
estes cheiros e sons,
suspendi então os olhos do caderno
sobre o qual minha caneta sangrava.
o fogo da vela tremeu com meu suspiro
fechei os olhos e parei de sangrar
os abri de novo
e peguei meu violão a me olhar,
por trás dos meus portões de aço
a rua cinco me ouviu cantar.
a rua cinco me ouviu cantar.